quinta-feira, 25 de março de 2010
Sobre tudo, o nada, ou a vida
CADERNO TEATRAL
IMPRESSÕES DE ESPETÁCULOS POR LUCIANNO MAZA
Uma parte do teatro contemporâneo é considerada, por muitos, vazia. É o movimento que abdica das grandes questões, dos fatos dramáticos, da reflexão temática, para falar, de modo prosaico, sobre o nada. Nada este que, na verdade, é uma tentativa de falar de tudo, em especial das pequenas coisas, dos microcosmos. Algumas vezes, porém, assistimos um espetáculo que, partindo do nada, revela muito mais do que poderíamos esperar, sobre a vida. A nova montagem da Companhia Brasileira de Teatro - uma das principais, não apenas de Curitiba, mas do Brasil – se lança nesta direção, desde o título: "Vida", que, ao mesmo tempo que abarca um infinito de possibilidades, não quer dizer objetivamente nada. Apoiando-se na obra do conterrâneo Paulo Leminski, mais em suas ideias e ambiente, do que numa adaptação de seu trabalho, o grupo criou uma situação onde integrantes de uma banda ensaiam um número para o jubileu da cidade onde moram – eles não são de lá. Numa sala, sem janelas, os quatro músicos, que parecem amadores, desfiam suas angústias e anseios, aquilo que os incomoda e desejam, seja um aniversário esquecido, uma vontade de ir para o espaço, querer ser o outro, ou manter-se na quietude do silêncio. Rompendo com a estrutura ficcional de dramaturgia, os personagens, como na vida, não estão presos a uma única linha de raciocínio, ou a ações coerentes e premeditadas, eles percorrem pensamentos labirínticos, falas e interrupções, ao mesmo tempo em que usam o passado da lembrança como tentativa de contato, ao contar sua história a quem os escuta, buscam no presente da relação de interesse do público, para suas idiossincrasias, o vínculo do agora: “Alguém escapou?” insiste uma das figuras, em cena, de tempos em tempos. Existe ali uma infinidade de recursos que vêm se cristalizando na cena contemporânea, desde os personagens que se chamam pelo nome real de seus atores, até as referências pessoais a suas carreiras, isso, não necessariamente acrescenta ao excelente resultado do espetáculo, mas, de certa forma, é coerente a proposta do diretor e autor do texto (cuja dramaturgia divide com as atrizes) Márcio Abreu, que rende, principalmente, quando aprofunda-se nos pequenos temas levantados para, sem demora, os cortar, passar para outro, geralmente quando a emoção está quase acontecendo, negando o clímax, como, enfim, fazemos em nossos diálogos reais. Esta opção fica evidente na interminável sequencia de finais, já que o encenador provoca imagens e climas que parecem apontar para a resolução do espetáculo para, depois, seguir adiante... Exatamente como é a vida, com seus pequenos finais, mas na qual, sempre, vamos em frente. A qualidade dos diálogos está diretamente ligada ao trabalho de apropriação do elenco, sem exceção, os quatro atores criam um conjunto maravilhoso, e têm total entendimento da linguagem que pesquisaram, e levaram para a cena. Giovana Soar, Nadja Naira, Ranieri Gonzalez e Rodrigo Ferrarini, tornam interessante, e atenta, a experiência de acompanhar a vida de seus personagens - ou seria a vida deles mesmos, ou ainda, a nossa própria vida? Consistente, "Vida" cumpre com sucesso sua proposta, bastante clara, e, com sua maestria, é um trabalho teatral de alta qualidade e valor artístico. O espetáculo, que estreou no Festival de Curitiba, entra em cartaz na cidade a partir de Abril.
O editor viajou a convite do Festival de Curitiba.
IMPRESSÕES DE ESPETÁCULOS POR LUCIANNO MAZA
Uma parte do teatro contemporâneo é considerada, por muitos, vazia. É o movimento que abdica das grandes questões, dos fatos dramáticos, da reflexão temática, para falar, de modo prosaico, sobre o nada. Nada este que, na verdade, é uma tentativa de falar de tudo, em especial das pequenas coisas, dos microcosmos. Algumas vezes, porém, assistimos um espetáculo que, partindo do nada, revela muito mais do que poderíamos esperar, sobre a vida. A nova montagem da Companhia Brasileira de Teatro - uma das principais, não apenas de Curitiba, mas do Brasil – se lança nesta direção, desde o título: "Vida", que, ao mesmo tempo que abarca um infinito de possibilidades, não quer dizer objetivamente nada. Apoiando-se na obra do conterrâneo Paulo Leminski, mais em suas ideias e ambiente, do que numa adaptação de seu trabalho, o grupo criou uma situação onde integrantes de uma banda ensaiam um número para o jubileu da cidade onde moram – eles não são de lá. Numa sala, sem janelas, os quatro músicos, que parecem amadores, desfiam suas angústias e anseios, aquilo que os incomoda e desejam, seja um aniversário esquecido, uma vontade de ir para o espaço, querer ser o outro, ou manter-se na quietude do silêncio. Rompendo com a estrutura ficcional de dramaturgia, os personagens, como na vida, não estão presos a uma única linha de raciocínio, ou a ações coerentes e premeditadas, eles percorrem pensamentos labirínticos, falas e interrupções, ao mesmo tempo em que usam o passado da lembrança como tentativa de contato, ao contar sua história a quem os escuta, buscam no presente da relação de interesse do público, para suas idiossincrasias, o vínculo do agora: “Alguém escapou?” insiste uma das figuras, em cena, de tempos em tempos. Existe ali uma infinidade de recursos que vêm se cristalizando na cena contemporânea, desde os personagens que se chamam pelo nome real de seus atores, até as referências pessoais a suas carreiras, isso, não necessariamente acrescenta ao excelente resultado do espetáculo, mas, de certa forma, é coerente a proposta do diretor e autor do texto (cuja dramaturgia divide com as atrizes) Márcio Abreu, que rende, principalmente, quando aprofunda-se nos pequenos temas levantados para, sem demora, os cortar, passar para outro, geralmente quando a emoção está quase acontecendo, negando o clímax, como, enfim, fazemos em nossos diálogos reais. Esta opção fica evidente na interminável sequencia de finais, já que o encenador provoca imagens e climas que parecem apontar para a resolução do espetáculo para, depois, seguir adiante... Exatamente como é a vida, com seus pequenos finais, mas na qual, sempre, vamos em frente. A qualidade dos diálogos está diretamente ligada ao trabalho de apropriação do elenco, sem exceção, os quatro atores criam um conjunto maravilhoso, e têm total entendimento da linguagem que pesquisaram, e levaram para a cena. Giovana Soar, Nadja Naira, Ranieri Gonzalez e Rodrigo Ferrarini, tornam interessante, e atenta, a experiência de acompanhar a vida de seus personagens - ou seria a vida deles mesmos, ou ainda, a nossa própria vida? Consistente, "Vida" cumpre com sucesso sua proposta, bastante clara, e, com sua maestria, é um trabalho teatral de alta qualidade e valor artístico. O espetáculo, que estreou no Festival de Curitiba, entra em cartaz na cidade a partir de Abril.
O editor viajou a convite do Festival de Curitiba.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário